Topolândia diz não a Contorno e prefeito propõe traçado sobre Cnaga





Em torno de 600 pessoas compareceram à audiência pública realizada na noite de sexta-feira na escola Josepha Sant´Anna Neves
Mara Cirino


O clima na escola Josepha Sant´Anna Neves, localizada no bairro Topolândia, região central de São Sebastião foi tenso na noite da última sexta-feira. Mais de 600 pessoas, a maioria moradores, compareceu à audiência pública para apresentação do Contorno Sul que ligará a rodovia dos Tamoios ao Porto, passando pelas cidades de Caraguatatuba e São Sebastião. Aqueles que usaram os microfones foram taxativos ao dizerem que não querem que nova estrada passe pelo bairro. Isso porque casas terão de ser derrubadas para a implantação das pistas. De acordo com a Dersa, na região da Topolândia são pelo menos 104 famílias que terão de ser reassentadas.


Medo de não pagamento por parte do Estado, desvalorização do imóvel e dificuldade de achar casas no padrão semelhantes foram os principais motivos apontados. Com camisetas escritas ‘Movimento Topolândia sem Rodovias’, essa foi a voz ouvida na escola. Diante do impasse, o prefeito Ernane Primazzi (PSC) apontou como alternativa que o traçado mude alguns metros e passe sobre a Companhia Nacional de Armazéns Gerais Alfandegados (Cnaga), o que gerou aplausos por parte dos presentes.


Um dos discursos que mais chamou a atenção foi de Bruno Cesar Jeremias de Souza que destacou a importância de ter o respaldo dos vereadores e alertou aos representantes da Dersa, empresa responsável pela obra que São Sebastião é diferente de São Paulo. “Aqui as pessoas se conhecem, estão próximas, têm suas casas. Falam em geração deemprego. A população não quer emprego, quer ser ouvida”.
Ele ainda mandou um recado aos políticos presentes. “Não queremos a rodovia aqui. Se isso ocorrer, vocês ficarão marcados com os legisladores que não fizeram nada quando essa barbárie passou aqui”.


O comerciante Fernando Puga frisou que ao invés de passar sobre as casas dos moradores da Topolândia, a Dersa deveria rever o traçado e entrar em acordo com a Petrobras para que retirasse um dos seus tanques de forma que a pista pudesse sair no local, sem necessidade de desapropriações. “Dessa forma, a Petrobras se redimiria dos excessivos vazamentos de seus tanques”, destacou e acrescentou que “chegou a hora de falarmos para a Petrobras dar a sua contrapartida para o município”.
Como resposta, o gerente de Relações Institucionais da Dersa, Ermes da Silva, destacou que o governo do Estado e a Petrobras são esferas diferentes e não poderia haver interferência nesse sentido.


Puga, que é filiado ao PT, foi convidado a fazer a articulação junto ao governo federal e a seu partido visando essa negociação de mudança do tanque. “Se você conseguir, será fantástico”, disse o representante da Dersa.
O oficial de cartório Alberto Boaventura de Souza se mostrou preocupado com o que um viaduto tão próximo da comunidade poderia trazer de ruim. “Essas obras de arte que vocês falam serão local de moradores de ruas, de pessoas que não têm o que fazer, por isso não queremos essa rodovia passando por aqui”.
Um dos discursos mais inflamados foi de João Amorim. “Vocês (Dersa) não têm mais autoridade moral para negociar com a população. Se fosse eu, pegava minha malinha e me arrancava daqui. Não estou fazendo discurso, mas defendendo o nosso pedaço e essa rodovia não vai passar na Topolândia, mas não vai mesmo!”, frisou.


Sobrou ainda para o governador Geraldo Alckmin, uma vez que a obra é conduzida pelo governo do Estado. “O mandante do crime é o governador que quer passar por cima da gente”. Ele alertou ainda que “se a reunião fosse dois meses atrás o resultado poderia ser diferente, mas hoje os brasileiros acordaram e se tiver que ir pra rua, vamos de novo”.
A assistente social Gisele Cristiane de Freitas também destacou que os atingidos não são ouvidos. “Que a bolsa aluguel que a Dersa quer pagar (R$ 400) é uma palhaçada, que seus colegas assistentes sociais que participarem desse processo de remoção de famílias precisam ser denunciados ao Conselho da classe. Temos como objetivo atender os diretos humanos, facilitar o acesso da população aos seus direitos e não contribuir para que sejam afetados”, alertou.


Para o professor Lucelmo Lacerda é preciso cobrar as compensações para o município em decorrência dos efeitos que essa obra vai trazer, como hospitais, escolas. Conforme a empresa, essas compensações já seriam previstas no licenciamento ambiental da obra, uma exigência legal e que 0,5% do valor do empreendimento já são depositados com esse objetivo. “O que se pode falar são em mitigações que o governo municipal pode discutir com o Estado”.
A relações públicas Camila Aquino observou que a obra tem de acontecer, mas que há outras alternativas, sugerindo a saída no bairro Varadouro, alguns quilômetros à frente. Ela ainda destacou o compromisso da empresa com a geração de emprego e qualificação de mão de obra para que os desempregados da cidade tenham condições de conseguirem uma vaga.

Ermes da Silva, da Dersa, destacou que no canteiro de obras vai ter uma sala para a realização de cursos de qualificação e que serão uma constante, onde o funcionário terá oportunidade de aprender mais profissões e crescer dentro da firma, desde que se qualifique.
O ruído que a rodovia vai provocar na vizinhança foi outro ponto debatido e Ermes esclareceu que a Cetesb fará medições antes e após a implantação do contorno, uma exigência federal, e que desde 2007 todas as obras deste natureza precisam de barreiras de ruídos.
A questão do emprego também foi a colocação de Elizia Faustino que observou ainda que 15 dias é um prazo muito pequeno para a qualificação do pessoal. “O que abre a possibilidade das construtoras trazerem trabalhadores de fora e com o fim das obras a população aumentar e não ter onde essas pessoas ficarem”.
Ela questionou também se o morador que tiver sua propriedade desapropriada vai receber apenas o quer foi avaliado ou algum outro percentual para uma nova escritura, ter a avaliação de um corretor que, conforme ela custa R$ 450, a ser desembolsado pelo dono do imóvel.


Ermes da Silva foi taxativo ao dizer que não, que se ocorresse isso o Estado poderia estar pagando a mais que o avaliado, gerando margem para ser taxado de irregularidade, “a não ser que a justiça determine o pagamento”, completou.
“A Rodovia dos Tamoios tem esse nome porque lá tombou o último índio Tamoio. Aqui vai ser a Rodovia dos Caiçaras, porque não vai sobrar um”, disse Luciano Nascimento ao mostrar sua indignação com a proposta apresentada. “Quem tem que dar licença para entrar nas nossas casas somos nós. Somos gente, não somos lixo!”


Políticos aderem ao Movimento Topolândia sem Rodovia e exigem mudanças em obras
Se na primeira audiência realizada no Morro do Abrigo o prefeito de São Sebastião, Ernane Primazzi, foi categórico ao dizer que não dará o licenciamento ambiental municipal caso a Dersa não promova mais alterações no traçado, no encontro realizado a Topolândia ele apontou como alternativa que a estrada passe por cima da Companhia Nacional de Armazéns Gerais Alfandegados (Cnaga) que conforme o mapa apresentado pelos técnicos da Dersa fica dois quarteirões de onde está o atual traçado.


“Será menos impactante retirar o armazém do que as centenas de famílias que podem ter suas casas demolidas”, justificou o prefeito. Hoje, ele deve se reunir com o governador Geraldo Alckmin e essa proposta será apresentada. O vereador Professor Gleivison Gaspar (PMDB) alertou para a dificuldade de achar imóveis na cidade para transferir a quantidade de gente que ficará sem sua casa. Destacou quando a Dersa enche a boca para falar de geração de emprego “uma realidade momentânea” e questionou o fato de o Plano Diretor não contemplar os efeitos dessa obra. “O PD não está pronto e é o que queremos para o futuro da cidade. Essa obra do governo não é do progresso, é do diabo, não é da comunidade”.


O vereador Luiz Antonio Santana Barroso, o Coringa, foi outro que lembrou que a Dersa não pode comparar São Sebastião com São Paulo. “São Sebastião é bem diferente, a Topolândia é bairro de família e São Paulo já se intitula cidade de ninguém”.
Para o parlamentar Ernane Primazzi, o Ernaninho (PSC), o mais chato não é falar para o Ermes, mas para o governador. “Não tenho tanta confiança nele. Algumas promessas feitas a São Sebastião ele não cumpriu”. Também alertou que essa não é uma luta política. “Agora é hora de juntarmos forças para trazer uma solução”. (M.C).


Foto: Jorge Mesquita/IL

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