Moradores de rua sofrem com frio e fome na região







Cachorros fazem companhia a moradores de rua no Centro de São Sebastião
Thereza Felipelli


Você está sentindo muito frio mesmo tendo roupas quentes e cobertores, aquecedores, e tomando sopinhas e bebidas quentes, certo?
Já parou pra pensar no que têm passado os moradores de rua, aqueles que muitos fingem não ver, que dormem sobre folhas de papelão, quase não tem o que comer ou beber, muitas vezes com cobertas fininhas (quando as têm) e roupas de verão?
Fomos conversar com alguns deles em São Sebastião, que estavam sob o teto de uma casa de shows fechada no centro da cidade. Havia cinco deles no local, além de quatro cachorros, seus companheiros.


A maioria desses moradores de rua tem dificuldades de encontrar ajuda, seja pra tomar um banho, pra comer um prato de comida, pra ter uma roupa quentinha para vestir. OsFundos Sociais de Solidariedade muitas vezes não dão conta de ajudar todos. São poucas as entidades que fazem trabalhos solidários, muitas igrejas ajudam. Perguntamos às quatro cidades o que elas fazem por essas pessoas, além de oferecer passagens de volta para suas cidades de origem. Confira a seguir.


Ilhabela
No arquipélago, o Fundo Social de Solidariedade de Ilhabela em parceria com a Secretaria de Assistência Social, arrecadou para a Campanha do Agasalho 2013, até o momento, cerca de 4 mil peças que, após triagem, são distribuídas a famílias carentes e entidades assistenciais do município.
Segundo a Prefeitura, em Ilhabela não há pessoas dormindo ao relento. Famílias da cidade que tenham algum parente nesta situação na cidade podem procurar a sede do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), na Barra Velha.


Ubatuba
Na cidade de Ubatuba, segundo Sérgio Maida, secretário de Desenvolvimento Social, as ações promovidas são no sentido de tentar reintegrá-los às famílias no município e, no caso de quem não tiver família na cidade, encaminhar as pessoas para seus municípios de origem. “Estamos nos preparando para a construção de uma estação de passagem e também de um Cras, mas momento não existe uma política de assistência social definida”, disse Maida.
Ainda de acordo com ele, Caraguatatuba manda muitos moradores de rua para Ubatuba. “Estamos tentando fazer um acordo pra evitar um trânsito de moradores de um município para o outro”, declarou o secretário, que acredita que a cidade não tem um grande número de moradores de rua. “São Paulo tem cerca de 16 mil pessoas morando nas ruas. Temos aqui menos que na Europa. Temos muitos migrantes e é difícil ter um número exato, mas estimo que Ubatuba tenha menos de 30 pessoas nessas condições. A cidade é acolhedora, eles gostam de vir pra cá”.


São Sebastião
O Fundo Social de Solidariedade de São Sebastião recebe os andarilhos e moradores de rua por meio de suas assistentes sociais. A pessoa que é encontrada pela Guarda Civil Municipal (GCM) ou recolhida por meio de denúncias é encaminhada também ao Fundo Social. Após análise junto às assistentes sociais, o Fundo encaminha para o primeiro atendimento como banho, troca de roupas, alimentação. Contudo, a política hoje é de auxiliar no retorno à sua cidade de origem com ajuda do custo para a passagem.


Na cidade, projetos como de igrejas como o Cáritas, da igreja católica, e igrejas evangélicas como a Assembleia de Deus e a Bola de Neve oferecem sopão ou pão e bebida quente durante a madrugada a esses moradores de rua. A Associação São Judas oferece também um trabalho anti-drogas. A Casa dos Passarinhos costumava oferecer um local para refeição e banho, mas fechou.
Segundo Afonso Escudero do Motoclube Cavalo Marinho, o grupo tentou oferecer ajuda a esses moradores em sua primeira ação beneficente há seis anos, mas não há estimulo porque muitos deles são “desovados” na cidade.
Segundo um dos membros da Bola de Neve, Márcio Oliveira, a cada 15 dias é realizada na igreja, sempre sexta-feira, a partir das 20h, uma ação de solidariedade, com atendimento básico de alimentação, higiene geral e, às vezes, distribuição de um kit com sabonete e pasta de dente. Todos recebem roupas, banho e fazem a barba, desde que queiram.


Caraguatatuba
Em Caraguatatuba, a prefeitura, por meio da Secretaria de Assistência Social, explica que possui uma política de atendimento ao homem de rua, desenvolvida junto à Casa Transitória. Há acolhimento e reinserção no convívio social. Após o acolhimento, é feita triagem psicossocial, garantindo o que preconiza a Constituição Federal, o direito de ir e vir. Se necessário e após contato com familiares e município de origem, são fornecidas passagens de retorno. Na Casa Transitória, também são oferecidos alimentação, roupas, higiene pessoal, podendo até dormir, se for o caso. Também existe o telefone de plantão: (12) 9750-8038.


Já o Fundo Social de Solidariedade esclarece que a Campanha do Agasalho 2013 arrecadou aproximadamente 32 mil peças e recebe colchões, casacos, cobertores e outros produtos durante todo o ano. Informa também que repassa as doações aos moradores que precisam após encaminhamento das assistentes sociais.
Os interessados em contribuir com o Fundo Social podem entregar produtos diretamente na sede do Centro, localizada na Avenida Sebastião Mariano Nepomuceno, 826, ou na região Sul, que fica no Centro de Referência de Assistência Social – Av. José Herculano, 6900, Porto Novo. Os telefones para outras informações são (12) 3885-2366 / 9118-5651.


Ainda de acordo com a secretaria de Assistência Social, devido aos dias de baixa temperatura, o serviço de Abordagem Social foi intensificado desde a última quinta-feira, sendo realizado todos os dias, das 19h às 22h. A equipe é formada por uma assistente social e um agente administrativo com o apoio da Polícia Militar.
Em Caraguá, a secretaria de Assistência Social garante o que preconiza a Constituição Federal, o direito de ir e vir, desta forma, não pode obrigar o acolhimento dos moradores. No primeiro dia, 24 moradores de rua foram abordados, sendo 15 munícipes e 9 oriundos de outras cidades. Dos 24, apenas uma pessoa aceitou o acolhimento na Casa Transitória. O telefone de atendimento da Casa Transitória é (12) 3887-6287, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. A secretaria de Assistência Social possui o telefone do Plantão que atende depois das 17h e aos finais de semana: (12) 9750-8038. No município, A Divina Providência, com base na Igreja católica Santo Antonio, recolhe verduras e legumes não comercializáveis dos supermercados, faz sopão e distribui de madrugada, além de manter um abrigo no bairro Rio do Ouro.
Um outro projeto chamado Mãos que Ajudam costuma distribuir sopão também para os moradores de rua da cidade.


Moradores de rua contam sobre as dificuldades enfrentadas que só pioram com o frio
Dissemos na reportagem acima que conversamos com cinco moradores de rua no centro de São Sebastião, que se abrigavam embaixo da entrada de um estabelecimento fechado há algum tempo. Paulo Henrique de Jesus, 41 anos, é fiscal de posturas da Prefeitura de São Sebastião (localizado logo ao lado de onde ele se encontrava no momento). É também estivador, está afastado do trabalho há anos. Motivo: alcoolismo. Sua mulher se suicidou há alguns anos e ele foi morar nas ruas.
“Ontem eu dormi só com um lençol fino. Enfrentei esse frio porque Deus é maravilhoso, poderia ter morrido de hipotermia. Não temos nenhum abrigo na cidade”, reclamou ele, que costuma ficar embaixo de um bar na Avenida Guarda Mor Lobo Viana. Sua companheira nas ruas, Karen Adriana Santos Bueno, 44 anos, toma banho na Praça da Vela, no Porto Grande.


“Falta oportunidade”
Ivanildo Ferreira do Nascimento, 29 anos, está na rua há exatamente um mês, que, de acordo com ele, “parece uma eternidade”. Ele contou que foi viajar e que, quando voltou, sua esposa havia vendido tudo que eles tinham e desaparecido. “Só preciso de uma oportunidade, sou formado em Educação Física, faço pinturas, texturas, mexo com hidráulica, elétrica. Esses dois cobertores aqui o Paulo Henrique que arrumou hoje na Assistência Social, a noite passada quase morremos de frio, foi horrível”, disse ele, que usava uma bermuda e não tinha roupas quentes e dividia um cobertor com um colega no momento da entrevista. “Ele está me emprestando um pedaço. À noite não sei como vai ser. Às vezes passa até maldade na cabeça da gente, mas Deus é mais. Mas pior que o frio é a fome”, desabafou. “Aqui a única ajuda que eles querem dar é passagem de volta pra casa. Mas voltar pra que casa?”, perguntou.


Companhia no frio e na fome
Quatro cachorros fazem companhia aos moradores de rua. “‘Tsunami’, ‘Biscuila’, ‘Branquinha’ e ‘Brisa’ defendem a gente aqui. Tem muitas pessoas que têm preconceito, sofremos muitas ofensas, humilhações”, lamentou Ivanildo, que disse que também tem gente que ajuda. “Tem gente que dá comida, a Associação São Judas, que fica aqui perto, quando abre, deixa a gente tomar um banho quente. O banho na Assistência Social é gelado”, disse.


Desagasalhados
Adilson Teodoro de Jesus, 36 anos, está nas ruas há oito anos, “briguei com minha família”.
“Estou em São Sebastião há três dias, mas já estive aqui antes. Cheguei terça-feira, esses dias estão muito gelados. Tem campanha do agasalho, mas não vemos ajuda”, reclamou. (T.F)


Fotos : Jorge Mesquita/IL e Vitor Braga

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